31.7.08

Umberto Eco, DOS e MAC

A Alexandra reproduziu excelente texto de autoria do Umberto Eco que ironiza o mundo da informática e que um professor dela havia lhe enviado quando a mesma adquiriu seu primeiro Mac. Bem, como o texto é muito bom e, no início de 2008, quem adquiriu o primeiro Mac fui eu, então resolvi passar para o português (muita audácia minha traduzir um texto de Umberto Eco:) mas vá lá, perdão ao grande autor se a mesma não saiu ipses literes) e dividir com alguns leitores que não compreendem inglês e que também acompanham este blog. 

“É fato. O mundo é dividido em usuários de Macintosh e usuários de computadores compatíveis com o sistema MS-DOS. Eu acredito piamente que  o Macintosh é Católico e o DOS é Protestante. De fato, o Macintosh é contra-reformista e tem sido influenciado pelo “ratio studiorum*” dos Jesuítas (*Nota da Paula : o ratio studiorium é um tipo de plano de estudos que sistematizou a pedagogia dos Jesuítas. O método consistia na pré-leitura, leitura, exercícios e na repetição. Os Jesuítas descobriram como a memória potencializava o aprendizado de maneira eficiente. Tudo feito com muita disciplina.). É prazeroso, amigável, conciliatório; diz aos seguidores como eles devem agir passo a passo para alcançar – senão o reino dos céus – o momento em que o documento deles vai ser impresso. Catequiza: lida com a essência da revelação por meio de fórmulas simples e ícones bem elaborados. Todos têm direito à salvação. 

O DOS é Protestante, ou até Calvinista. Permite livre interpretação da sagrada escritura, exige difíceis decisões pessoais, impõe sobre o usuário uma sutil hermenêutica, e assume sem questionamento a idéia de que nem todos conseguem atingir a salvação. Para fazer o sistema funcionar você precisa interpretar o programa por conta própria: Bem distante da comunidade barroca, o usuário experimenta forte intimidade com a solidão de seu próprio tormento interior. 

Você pode até se opor a este argumento. Com a transição para o Windows, o universo DOS passou a se assemelhar mais com a tolerância contra-reformista do Macintosh. É verdade: o Windows representa uma dissidência do estilo Anglicano, suntuosas cerimônias na catedral, mas há sempre a possibilidade de um retorno ao DOS mudar as coisas de acordo com estranhas decisões: em se tratando disso, você pode decidir canonizar mulheres e homossexuais se assim o desejar. 

Naturalmente, nem o Catolicismo nem o Protestantismo têm qualquer relação com as escolhas culturais e religiosas de seus usuários. Questiona-se talvez se, com o passar do tempo, o uso de um sistema em detrimento do outro acarrete em profundas mudanças interiores. Você pode usar DOS e apoiar Vande? E mais: Celine teria escrito usando Word, WordPerfect, ou Wordstar? Descartes programou usando a linguagem Pascal? 

E código de máquina, que está por trás de tudo e decide o destino de ambos os sistemas (ou ambientes, se você preferir)? Ah, isso pertence ao Antigo Testamento, e é Talmúdico* (*nota da Paula: o Talmud é o texto básico da lei Judaíca) e cabalístico." 

3 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom, Paula! Deixaria o Umberto orgulhoso!

Em pensar que comecei com um Apple (antes do MAC) e estou vendida à MS...

:= disse...

Umberto Eco é imbatível!
Bjs

Nanny Kyrillos disse...

Amei!
2009 seremos os novos adeptos!Ah...do MAC..lógico! Será que é pecado?!
Beijos