4.6.10

Realidade nua e crua

É fato. Raça e sexo continuam sendo barreiras para os imigrantes que chegam em Ontario e tentam se inserir no mercado de trabalho. A pesquisa divulgada ontem, com base em dados no Censo de 2005, constata o que não é novidade nenhuma para quem mora aqui e vive o mundo real do estrangeiro que recomeça sua vida: o preconceito racial e o sexismo estão bem presentes e bem vivos por aqui. É a realidade. Nua e Crua.

Em 2005, diz a economista responsável pelo estudo Sheila Block, uma mulher estrangeira, ganhava 53.4 centavos de dolar para cada dolar recebido por um homem branco. Como estamos hoje? Pior - constata o estudo. Um homem recém-chegado em Ontario ganha 63 centavos de dolar para cada dolar recebido pelo homem nascido no Canadá. Entre as mulheres recém chegadas a situação é ainda pior. Em 2008, faziam 54 centavos para cada dolar do homem nascido no Canadá.

Não esqueçamos que estamos aqui falando de pessoas já empregadas, ou seja, não se discute se falam o idioma. Falam. Caso contrário não teriam sido contratadas. Digo isso porque não raras vezes o debate em torno da questão fica inapropriadamente centrado no fato de falar ou não falar o idioma. Com isso, o governo facilmente justifica seus investimentos nos recém chegados com uma indústria enorme de cursinhos do "B A B A" do inglês, ensinando literalmente como se apresentar e dizer "oi tudo bem" e os empregadores ficam confortavelmente "apoiados" na falácia de que não mantiveram alguém em seu quadro de funcionários ou , se mantiveram, pagam menos porque fulano não domina o "B A B A" do inglÊs, ou pior, não tem experiência canadense.

E o ciclo vicioso não tem fim. Ninguém coloca o dedo na ferida. Que ferida? O preconceito. Entra ano, sai ano, estudo atrás de estudo e a situação permanece onde está. Uma pena porque estudiosos como a economista que liderou o mais recente relatório sempre sugerem o óbvio mas ninguém quer cutucar a ferida.

Em tempo - eu não sou e nem nuca fui contra os cursinhos "B A BA" bem basiquinhos que o governo mantém para recém chegados. Sempre há público para tal, o problema é que enquanto governo, empregadores e autoridades continuarem se escondendo por trás da cortina que é a indústria de cursinhos "B A B A" para os imigrantes, ninguém faz o que realmente é necessário : políticas de governo que obriguem os empregadores a não praticar este tipo de preconceito. Melhor ainda e muito mais utópico - que a política de imigração esteja mais alinhada com as práticas de mercado e vice-versa. Com isso todos ganham.

Sonhar não custa nada. Bom fim de semana à todos.

4 comentários:

Jeanne disse...

Não sei se interessa ao governo arranjar briga com os empresários, e tb não sei se esse mesmo governo tem interesse que o imigrante consiga um trabalho decente, afinal, só apra entrar no país o cara tem que trazer pelo menos 12 mil dólares. Cada imigrante que chega aqui representa mais consumo, e portanto, mais dinheirinho de impostos na mão do governo. É o que eu sempre digo e repito: o governo canadense escancara as portas para os imigrantes, mas os empresários abrem apenas uma frestinha na janela.Muito triste.

cecisantiago disse...

Oi Paula, achei seu blog na minha procura por informações através de brasileiros que moram aí..sobre a vida aí. Devo ir pra Hamilton, perto dái de Toronto, passar de 6 meses a 01 ano com meu marido e filho de 02 e 08 meses. Você conhece algum brasileiro por lá? queria algumas informações sobre ONtário também, visto que morei em Calgary há 04 anos e lá é tudo diferente, será que poderia me ajudar? Meu email é cecitravassos@hotmail.com
Obrigada, Cecília

Margareth disse...

Oi Paula.
Meu marido e eu estamos indo para o Montreal em breve. Aqui no Brasil enfrento um problema de diferença salarial dentro da minha equipe com pessoas que exercem a mesma função que a minha, sei exatamente como é. Vc aí no Canadá, já sentiu isso na pele? Já sofreu algum tipo de discriminação por ser imigrante ou por ser mulher?

Unknown disse...

Paula, achei o seu blog por acaso e gostei muito dos seus posts. Esse, em especial, foi spot on. O Canadá de fato não põe o dedo na ferida do preconceito e da discriminação em relação aos imigrantes, especialmente aqueles oriundos de países em desenvolvimento. Agora, pior do que o Canadá não assumir essa discriminação, é ver blogueiros brasileiros tapando o sol com a peneira, escondendo a realidade de seus compatriotas e às vezes até boicotando/ameaçando quem coloca a boca no trombone. Isso, para mim, é incompreensível. Já li blogs de brasileiros que mais parecem propaganda oficial do governo canadense. Por que será que encarar a realidade assusta tanto? Em relação ao seu post, honestamente, depois de ler vários estudos e reportagens sobre o tema, tenho sérias dúvidas em relação às reais intenções do programa de imigração canadense, mormente quando se trata de imigrantes qualificados de países em desenvolvimento. Não sei se há ingenuidade ou má-fé mesmo, pois a situação é muito proveito$a e conveniente para a economia do Canadá que, ainda por cima, sai com a imagem de mocinho por abrir as portas a imigrantes de países em desenvolvimento (desde que tais imigrantes tenham dinheiro e façam parte da elite em seu país de origem, claro). Acho que essa situação mereceria uma investigação mais profunda, inclusive por parte do governo brasileiro que perde gente qualificada e dinheiro com essa estória. Muitos vem, gastam seus recursos aquecendo a economia canadense e, ainda por cima, trabalham em subempregos ou em postos menos qualificados aqui no Canadá, isso quando trabalham. Se vc. tiver oportunidade, leia o artigo da professora Nilce da Silva, da USP, sobre os emigrantes brasileiros em Trois-riviére (Silva, N (2010) “A emigração lusófona na região do Quebec: reflexões sobre a escolarização em língua portuguesa no ano em que Saramago morreu”. Millenium, 39: 9-18). O texto está disponível na internet. Ela coloca algumas reflexões bem interessantes ali. Abs.